A notícia chamou-me a atenção pelo facto de referir a criação de um edifício da PSP (Polícia de Segurança Pública), quando o aeroporto está situado numa área onde a força de segurança territorialmente competente para o policiamento é a Guarda Nacional Republicana.
É óbvio que nos aeroportos internacionais que existem neste momento em Portugal (Lisboa, Porto e Faro) a vigilância e protecção são da responsabilidade da Polícia de Segurança Pública, dado que estas infra-estruturas aeroportuárias estão incluídas nas áreas da sua responsabilidade de policiamento.
No entanto, quer o aeroporto de Beja, quer o futuro aeroporto de Lisboa estão situados em áreas cujo policiamento está a cargo da Guarda Nacional Republicana. E tal como por diversas vezes o poder político fez questão de vincar aquando da reorganização e reestruturação das forças de segurança, ambas estão numa posição de paridade, a distinção ocorre em termos de estatuto (uma civil e outra militar) e nalgumas atribuições específicas.
Se analisarmos as respectivas leis orgânicas, no que concerne à Guarda Nacional Republicana, verificamos que na alínea j) do artº 3º da Lei 63/2007 se refere que constitui atribuição desta força de segurança “manter a vigilância e a protecção de pontos sensíveis, nomeadamente infra-estruturas rodoviárias, ferroviárias, aeroportuárias e portuárias, edifícios públicos e outras instalações críticas.” O mesmo sucedendo relativamente à Polícia de Segurança Pública, cuja alínea j) do Artº 3º da Lei 53/2007 refere que constitui atribuição desta força de segurança “manter a vigilância e a protecção de pontos sensíveis, nomeadamente infra-estruturas rodoviárias, ferroviárias, aeroportuárias e portuárias, edifícios públicos e outras instalações críticas.”
Mas no plano das atribuições específicas, nos termos da alínea g) do nº 2 do Artº 3º da LO/GNR, compete a esta força de segurança “executar acções de prevenção e de intervenção de primeira linha, em todo o território nacional, em situação de emergência de protecção e socorro, designadamente nas ocorrências de incêndios florestais ou de matérias perigosas, catástrofes e acidentes graves.”
Bem como nos termos da alínea b) do nº 2 do Artº 3º da LO/GNR, constitui atribuição da GNR “garantir a fiscalização, o ordenamento e a disciplina do trânsito em todas as infra-estruturas constitutivas dos eixos da Rede Nacional Fundamental e da Rede Nacional Complementar, em toda a sua extensão, fora das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.”
Assim, a vigilância destas duas novas instalações aeroportuárias deverá ficar a cargo da Guarda Nacional Republicana porque:
1. Constitui atribuição desta força de segurança a manutenção da vigilância e a protecção deste tipo de infra-estruturas, desde que estejam inseridas na sua área de responsabilidade, porque tanto a GNR como a PSP em termos de atribuições estão num plano de paridade e o que releva é a situação geográfica, a qual neste caso joga claramente a favor da GNR.
2. Depois temos a vertente protecção e socorro, a qual é atribuição específica da GNR em todo o território nacional, e se há locais onde existe uma elevada susceptibilidade de ocorrerem catástrofes e acidentes graves é nas instalações aeroportuárias, conforme já ficou claramente demonstrado por diversas ocorrências deste género, como seja o caso daquela que ocorreu a 20 de Agosto de 2008 com um avião da Spanair em Madrid. Além de que associado a esta vertente a única força de segurança que em Portugal detém pessoal formado para actuar em ambientes DVI (Disaster Victim Identification) é a Guarda Nacional Republicana, conforme já foi amplamente divulgado pelos órgãos de comunicação social, constituindo uma prioridade absoluta a identificação das vítimas resultantes destes e doutros tipos de catástrofes, devido aos danos morais e materiais que daí podem advir.
3. Competindo ainda à GNR a fiscalização, o ordenamento e a disciplina do trânsito nos moldes acima referidos, os quais estão intimamente relacionados com os novos aeroportos.
4. Não se devendo perder de vista que a GNR tem estruturas operacionais devidamente formadas e apetrechadas para intervir nas mais diversas situações que podem ocorrer neste tipo de infra-estruturas, designadamente, tanto ao nível fiscal, como de manutenção e restabelecimento da ordem pública, resolução e gestão de incidentes críticos, intervenção táctica em situações de violência concertada e de elevada perigosidade, complexidade e risco, segurança de instalações sensíveis e de grandes eventos. Dispondo também de valências associadas a este bloco como seja o caso das estruturas de negociação.
5. Contudo e à falta de argumentos válidos, é provável que alguns partam para o política do baixo argumento e venham afirmar para a praça pública, mais uma vez, que o nível de habilitações exigido para a GNR é mais baixo do que para a PSP, e que isso poderá interferir no desempenho profissional naquilo que cada vez mais são consideradas, actualmente, as portas de entrada e de saída de qualquer país. Mas também esse argumento cai por terra, conforme foi demonstrado ainda recentemente aquando da abertura de concurso para a Guarda, no âmbito do qual recebeu 14.432 candidatos, enquanto a PSP se ficou pelos 4.653, destes 6.300 têm o 9º ano, 1.000 o 10º, 1700 o 11º e 5.300 o 12º ou mais (32 bacharéis, 301 licenciados, 4 mestres e um com pós graduação). Portanto só os detentores de habilitação igual ou superior ao 12º ano são em número superior à totalidade dos candidatos à PSP, sendo que em regra só os detentores de habilitação igual ou superior ao 11º ano conseguem ultrapassar as provas de admissão.
6. Finalmente, no que diz respeito à PSP, no plano das respectivas atribuições específicas, não se vislumbra nada que possa fazer propender a balança a seu favor em termos de policiamento destes novos espaços de entrada e saída de Portugal.
Outros argumentos se poderiam apresentar, mas acho que estes serão suficientes para despertar a consciência daqueles que por vezes andam meio adormecidos, e que só acordam para a realidade quando o mal já está feito.
A acontecer uma situação destas, tratar-se-ia de um grave atentado à imagem da Guarda e dos seus militares, do qual muito dificilmente recuperaria.
Túlio Hostílio
Em 20 de Outubro corrente, o Zé Guita colocou no post referido este comentário: