Num livro de cunho panfletário intitulado A Tropa, que pretende relatar experiência e observação pessoal do serviço militar entre Junho de 1970 e Outubro de 1977, A. Luizello Alves afirma e procura demonstrar que o sistema militar se encontra em crise, assumindo uma visão crítica claramente de esquerda.
Descrevendo e criticando largamente o serviço militar obrigatório em particular no exército, aborda também alguns aspectos da vivência dos militares profissionais. Segundo este autor, os métodos militares de comando encontrariam fundamento muito mais na obrigação do que na adesão, acontecendo que, sobretudo nas unidades de elite, quadros bastante “militarões” fariam vigorar um estado de espírito muito militarista e sectário. Sendo o efectivo enquadrado por pessoal de carreira, isto é, profissionais, o estilo de comando caracterizava-se pelo respeito absoluto em relação ao princípio hierárquico. Pondo em relevo o facto de os militares se exprimirem pouco e evitarem fazê-lo sem prévia submissão ao controlo superior; acrescendo a sua não participação na vida política; apontava um grande imobilismo à vida militar.
Luizello Alves considera que “A condição militar actual é fonte de frustração, mal-estar e inquietação”, mantendo tradições ultrapassadas, demarcando-se dos civis, recusando renovar os métodos de comando e os ritos militares, formando os quadros com o espírito do passado. O exército não teria sabido evoluir, uma vez que embora fazendo a revolução técnica – sem reconhecer a preponderância do factor humano – não passou pela revolução cultural. Aqui, questiona a formação dos militares profissionais e os seus educadores.
Para este autor - em linha com o mito do super-homem de Nietzsche - a formação militar e os seus educadores sofrem a influência do modelo tradicional, marcado pelas qualidades do cavaleiro e com forte sentido da disciplina e do dever, persistindo em glorificar a vocação de chefe de alguns e a submissão para a obediência dos executantes.
O autor reconhece que a instituição militar se baseia “muito mais no princípio hierárquico e no sentido da disciplina, em todas as circunstâncias, do que na iniciativa e na imaginação”, mas daqui resulta haver oposição e tensão permanentes entre tais aspectos da personalidade de base. O princípio da hierarquia e a iniciativa são conciliáveis pela limitação do militar a um sistema de valores específico, estável e muito simples: ordem, disciplina e serviço.
O carácter e a disciplina encontram síntese ao conceber o cumprimento da missão, com maior peso para a disciplina e com apertados limites para a iniciativa.
As escolas militares, com a pretensão principal de formar o carácter, isolariam os formandos da sociedade civil, o que tornava necessária a sua reforma e esta passaria por abrir o ensino militar à luz do exterior.
Numa visão característica do chamado “período revolucionário em curso”, a propósito do controlo permanente da instituição militar pelo poder político, interroga-se sobre a criação de comissários para as forças armadas a designar pelos diferentes grupos políticos.
Sobre a opinião pública acerca dos militares, descreve-a como vendo nestes preguiça, falta de inteligência, espírito de rotina, brutalidade, mesquinhez. E aponta como forma de criar um melhor estado de espírito, promover uma melhor atmosfera, aproximando a vida militar da vida civil, expulsando a berraria dos graduados, difundindo música, decorando os corredores, multiplicando os jornais de parede. Quanto ao cerimonial e aos rituais, não sendo necessariamente condenáveis, deveriam ser reduzidos ou ser-lhes atribuído diferente significado. E conclui em jeito profético ser defensável para um moderno futuro próximo “uma estratégia de não-violência ou de desarmamento”.
Alves, Armando Luizello – A Tropa (Também Há Quem lhe Chame O Exército). Lisboa: Delfos, 197(8?).
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